segunda-feira, 9 de maio de 2011

A Coragem do Adeus

Era como se da felicidade tudo agora se tornasse um fluir constante de tristezas que não pudessem ser apagadas pelas peripécias do tempo. Os sentimentos mais insólitos passaram a substituir as ações calculadas do cotidiano que foram impostos pela monotonia de uma vida sensata e moralmente correta.
Tudo o que ele mais queria era poder usufruir daquela liberdade dos amantes que sem o menor pudor gritam aos quatro ventos para que todo mundo ouçam os seus sussurros e gemidos que foram proferidos pelo instante incólume de um encontro inesperado, mas que ressoou pelo resto das suas existências.
Estava cansado de fazer as mesmas coisas e de sempre dar satisfação e justificativas das suas ações. Queria poder ter a coragem de dizer adeus sem olhar para trás e sem sentir a dor da partida e aos poucos imaginava como poderia acontecer, afinal, não possuía nenhuma desculpa para abandoná-la, no entanto, não entendia quais eram os verdadeiros motivos que a prendiam àquela mulher, ou o que ele iria perder se jogasse tudo para o ar e se aventurasse em um novo romance. Talvez se ao invés de falar pudesse escrever algo que fosse convincente e que o eximisse da sensação de passar por todo o infortúnio da sinceridade declarada através dos gestos?
Tirou do bolso do paletó o pequeno bloco de anotações e o pequeno lápis que sempre carregava como forma de reparar seus lapsos de memória (era avesso ao uso de canetas ou agendas eletrônicas), sentou-se no primeiro local que achou mais adequado e curiosamente tratava-se da escadaria da mesma igreja que há vintes anos tinha jurado amor eterno a uma mulher que depois lhe daria três filhos magníficos como frutos dessa união. Pensou que se existisse destino ele estaria sendo alvo de peripécias naquela ocasião, mas não acreditava nisso e pela primeira vez decidiu seguir o que a sua consciência estava disposta a lhe ordenar.
Mas não sabia por onde começar e quais palavras se encaixariam tão adequadamente para tal situação. Sentia-se impotente para externar seus sentimentos e no momento em que pensou ser aquela a oportunidade de se libertar das amarras das regras e das sanções foi cercado bruscamente pelo medo que lhe formou uma prisão mais rígida ainda. O papel permanecia em branco mas na sua mente as ideias não se cansavam de querer emergir, era como se, uma vez escrito teria que seguir à risca tudo o que fosse professado sem titubear nem voltar atrás com arrependimentos vãos.
Sentiu-se covardemente traído pelas suas vontades e por mais que não fosse dessa vez, sabia que não tardaria o momento em que precisava abrir o seu eu e finalmente viver da forma como ele julgava querer ser.

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